segunda-feira, 4 de agosto de 2008

PALAVRAS, MORTAS, OU ETERNAS?

“Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo” (Mateus 10:28).

“kai mh fobhqhte apo twn apokteinontwn to swma thn de yuchn mh dunamenwn apokteinai fobhqhte de mallon ton dunamenon kai yuchn kai swma apolesai en geennh”. (texto original grego)

Quando Jesus disse estas palavras, Ele bem sabia a dimensão exata do que isso representava para os seus discípulos. Afinal, o Filho de Deus se fez homem, assumindo e vivendo na própria carne todas as emoções e sentimentos que um ser humano pode viver, e o viveu intensamente, até seu último suspiro. Certamente, Ele não se referia unicamente à morte do corpo em si, mas de tudo quanto o corpo (do grego swma) representa. E representa todo universo físico, palpável e mensurável, que norteia a vida. Do mesmo modo, Jesus não só fez menção aos assassinos, mas também àqueles que podem nos trair, roubar, caluniar ou ferir o coração. Assim, não temer “os que matam o corpo” é estar disposto a continuar lutando, mesmo que se perca tudo na vida. Pois, infelizmente, é nessa hora que muitos morrem, mesmo continuando a respirar.

Tradicionalmente, a palavra yuchn é traduzida como alma, o que traz à maioria das pessoas a concepção de um “fantasma” ou um ser espiritual que habita um corpo sem necessariamente depender do corpo para sua existência. Sem querer abordar os méritos ou deméritos das teorias antropológicas religiosas, quero trazer a luz o fato de que yuchn ou psushe tem sua conotação direta com mente e assim podemos relacioná-la aos pensamentos, ideais, conhecimentos, ensinamentos, fé, sabedoria. E é dentro dessa raiz que queremos nos ater, pois acreditamos piamente que essa é a essência do que Cristo estava tratando neste texto.

A análise contextual nos mostra que Cristo estava incentivando aos seus discípulos a proclamarem sua fé, aquilo que aprenderam de Cristo e conseqüentemente criam. A verdade é que eles receberam de Cristo um conhecimento sem precedentes, e seus pensamentos estavam sendo forjados pelo fogo do qual nenhum homem havia provado até então. Assim estava se formando a psique dos Apóstolos. Por certo, não podia, uma psique tão preciosa morrer com os discípulos. Era preciso proclamá-la aos quatro ventos. Mais tarde Jesus diria: "Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura". Dessa psique, os ensinamentos de Jesus, ainda hoje, depende a transformação do mundo.

As idéias, os pensamentos, as palavras, os conhecimentos, enfim a psique morre com seus portadores quando não é proclamada. E diante dessa perspectiva quero dizer que podem roubar-nos os bens, ferirem-nos o coração, trair-nos deliberadamente, podem até matar-nos o corpo, mas não poderão destruir nosso conhecimento adquirido e transmitido, seja por artigos, livros, pregações, discipulado, conversas e músicas. Não poderão apagar do coração dos que nos ouvem, toda psique transmitida.

Outro fator importante é a compreensão etimológica da palavra inferno, aqui traduzida do original geennh, uma palavra grega usada para referir-se ao vale de Tofete, um grande e conhecido cemitério onde muitas vezes foram realizados sacrifícios de inocentes. A palavra geennh é citada onze vezes, no Novo Testamento, sempre por Jesus, para aludir a morte eterna ou castigo sobre Israel. No caso deste texto, o termo inferno não se refere a um lugar metafísico, assim como o termo alma não se refere a um “ser” metafísico. Jesus referiu-se a geennh como o destino do corpo sem vida, isto é, cemitério. Lugar para onde a psique vai junto de seu portador, quando este a guarda para si e não a anuncia aos outros.

Analisando as palavras de Cristo, me pergunto: O que poderia “fazer perecer no inferno tanto o corpo, quanto a alma”? Simples: O desânimo, o desistir, a timidez. Enfim, o que faz calar, o que intimida, acovarda, que faz morrer os ideais, esmorecer a fé, matar a psique. Não é à toa que Apocalipse 21:8 afirma que os tímidos (ou covardes) morrerão eternamente.

A história nos ensina que grandes homens são aqueles que desafiaram o morno, o normal, a rotina e não omitiram o conhecimento que receberam, não desistiram de lutar pelo que acreditavam, não se intimidaram frente às dificuldades, não traíram a Deus nem à própria consciência. Os grandes homens ousaram falar, mesmo sabendo que seriam criticados e escarnecidos, proclamaram a verdade, mesmo que sua cabeça estivesse em jogo. Não foi por acaso que João Batista, um homem a quem não se atribui nenhum milagre, foi, segundo Jesus, o maior dos profetas. Por quê? Porque não se intimidou frente às ameaças, mas proclamou o tempo de conversão e por isso foi morto. Mataram seu corpo, mas sua voz continua clamando pelos desertos; seu corpo pereceu, mas sua psique vive ainda hoje, gerando frutos para a eternidade.

Nossa passagem nessa terra pode ser insignificante ou transformadora. Tudo depende de como nos portamos diante da própria fé. A morte do corpo é destino certo para todos, mas uma psique forjada no fogo do Espírito de Deus, transformada pelo Evangelho de Cristo e transmitida aos homens e mulheres de todos os povos, é a arma poderosa para transformar este mundo. A Palavra de Jesus é Palavra de Vida, é a Palavra que cremos e anunciamos. Não a levemos para a sepultura, anunciemo-la, eternizemo-la.



Rev. Julio Zamparetti Fernandes
Sermão dominical de 03/08/2008
REINA – Igreja do Futuro

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